Lucas Foster é psicólogo especialista em criatividade. Em 2011, fundou a ProjectHub, empresa de tecnologia que acelera e simplifica o investimento em projetos criativos com foco na experiência de vida das pessoas, na inovação e no desenvolvimento sustentável. Atende clientes como Google, Mercado Livre, YouTube, entre outros gigantes.
Para ele, é difícil fazer planos de futuro para os negócios no Brasil, por isso prefere ver os negócios em “ciclos de amadurecimento”. “Penso que (fazer negócio no Brasil) é como plantar uma semente saudável em um solo instável. Por mais que tenha potencial, os fatores externos podem destruir uma safra”, diz ele, que na entrevista abaixo conta mais de sua experiência como empreendedor.
O empreendedor Lucas Foster, do ProjectHub. Foto: Rafael Arbex/Estadão
Como é ser empreendedor com um pé na psicologia?
Me formei em psicologia, mas sempre me interessei pelo empreendedorismo. Meus avós eram empreendedores, assim como meus pais. Nasci e vivi a maior parte da minha vida na região da Avenida Paulista. Sou filho de pais que vieram do interior nos anos 1960, cresceram na periferia da cidade e conquistaram muitas coisas por uma extrema dedicação aos estudos e ao trabalho.
Como surgiu o empreendedor em você?
Meus pais assinavam as revistas em quadrinhos da Turma da Mônica, que chegavam todo mês, desde os meus 6 anos de idade. Um dia, decidi pegar todas elas e levar na calçada da rua onde a gente morava. Junto com meus amigos, vendemos tudo e, ao final do mês, tínhamos dinheiro suficiente para comprar alguns brinquedos e ir a uma lanchonete da Rua Augusta. Tenho na minha recordação que essa foi a minha primeira experiência empreendedora. Só não continuei fazendo isso porque tinha acabado o estoque (risos).
Já na vida adulta, decidi empreender porque não enxergava outra alternativa para o desenvolvimento da minha vida profissional. Eu tinha começado minha carreira no setor público, pois acreditava na missão de qualificar a experiência de vida das pessoas de maneira direta e efetiva. No entanto, a burocracia e a cultura do setor público no Brasil dificultam bastante a realização deste propósito. Com isso, tentei buscar emprego no setor privado, mas não conseguia me encaixar nas vagas que me interessavam. Assim, fiquei com duas alternativas: ou voltava para a faculdade ou empreendia. Decidi empreender.
E a ProjectHub?
Após realizar um período de estudos em liderança internacional fora do país, retornei ao Brasil, em 2010, com o desejo de empreender para qualificar a experiência de vida das pessoas, um propósito que me acompanhou durante toda a vida e que se tornou realidade em 2011.
No início, quando registrei o domínio do site e fiz minha primeira apresentação comercial, a única coisa que tinha certeza era que minha empresa iria trabalhar para qualificar a experiência de vida das pessoas. O resto foi consequência do meu entusiasmo em trabalhar por este objetivo.
A família participa do empreendimento, do estilo de vida?
Minha família foi determinante para minha decisão de iniciar um negócio e continuar persistindo até ele dar certo. O investimento financeiro que eles fizeram no início foi: não me expulsar de casa e oferecer um teto, roupa, comida, um computador e acesso à internet até que eu começasse a ganhar dinheiro por conta própria, o que levou quase um ano.
No entanto, o verdadeiro e principal apoio que eles me deram foi afetivo e emocional. Tinham a paciência de me ouvir e conversar comigo sobre as coisas que tinham acontecido naquele dia, incentivar e valorizar minha coragem e meu empenho. Sem dúvida alguma, o acolhimento emocional dos meus pais foi o melhor investimento que eles poderiam ter feito, pois o custo financeiro era baixo, mas o retorno em dedicação, persistência e equilíbrio emocional eram muito altos.
Com isso, foi questão de tempo até encontrar o modelo de negócios certo que equilibrasse o propósito de trabalhar para qualificar a experiência de vida das pessoas e a necessidade de ganhar dinheiro com isso.
Para o empreendedor, os dias e noites são bem diferentes do “normal” das pessoas. Como é isso com você?
Existe uma grande diferença entre o tempo do empreendedor e o tempo do colaborador. Ambos são essenciais e interdependentes. A convenção de um período fixo do dia dedicado para o trabalho permite ao colaborador a possibilidade de estabelecer uma rotina um pouco mais estruturada, mas não é uma realidade comum ao empreendedor.
Ao mesmo tempo em que o empreendedor precisa ser responsável por liderar o negócio e gerar oportunidades que tragam o faturamento necessário para preservar essa rotina aos colaboradores, essa condição permite ao empreendedor ter uma flexibilidade maior no seu dia a dia, inclusive para assumir compromissos e responsabilidades afetivas que não dizem respeito ao conjunto de deveres dos colaboradores, como a ansiedade com o futuro, as incertezas do mercado, as mudanças no relacionamento com fornecedores, parceiros e governo e, principalmente, a necessidade de manter seu negócio competitivo e relevante para seus clientes.
Aos poucos, portanto, fui perdendo o contato com meus amigos que escolheram uma trajetória corporativa e fui me identificando, cada vez mais, com outros empreendedores e empreendedoras considerando que os desafios e a realidade são mais parecidos. Hoje, faço parte de vários grupos e comunidades empreendedoras no Brasil e em outros países sempre com a intenção de construir uma rede de apoio que ajude cada um de nós a ser melhor um dia após o outro.
Quais são os planos para os próximos anos?
É muito difícil fazer planos de futuro para os negócios no Brasil. Penso que é como plantar uma semente saudável em um solo instável. Por mais que tenha potencial, os fatores externos podem destruir uma safra. Por isso, prefiro olhar para a evolução dos nossos negócios em ciclos de amadurecimento.
Desde a fundação da ProjectHub, vivemos três ciclos de amadurecimento com resultados expressivos. Agora, estamos iniciando nosso quarto ciclo de amadurecimento. Em 2019, vamos anunciar a criação de duas novas empresas, o LabCriativo (empresa de mídia e educação) e a Originals Media House, nossa empresa produção audiovisual.
Ao mesmo tempo, continuaremos investindo para trazer novos talentos e mais inovação para a ProjectHub, nossa empresa de tecnologia que fornece software para grandes empresas fazerem a transformação digital de seus investimentos de marca, reduzindo custos e desperdícios de tempo e energia de seus colaboradores.
Se você pudesse dar uma dica aos empreendedores que estão chegando agora, qual seria?
Os setores ligados à criatividade e à inovação estão em forte expansão. Com a evolução das novas tecnologias e cada vez mais pessoas conectadas, novos modelos de negócios surgem diariamente e, portanto, mais oportunidades para novos empreendedores. A melhor maneira de começar nesta área é pesquisando o mercado, participando de grupos e comunidades ligadas ao tema e testando sua ideia antes de realizar grandes investimentos.
Compartilhe suas ideias de maneira saudável com pessoas próximas e confiáveis. Teste o seu discurso e crie um MVP (minimum viable product, ou produto mínimo viável) antes de contratar pessoas ou assumir custos fixos robustos. Ou seja, minha principal dica é que os entrantes sigam um conceito usado pelas startups chamado “bootstrapping”.
Fazer bootstrapping significa começar um negócio a partir de recursos limitados, sem o apoio de investidores. Ou seja, nessa forma de iniciar startups, o empreendedor geralmente utiliza recursos próprios para lançar o negócio sem o apoio de fundos de investimento e prioriza o faturamento com clientes em vez de ir em busca de grandes investidores.
Qual o futuro do Brasil?
O futuro do Brasil é promissor. Temos um mercado consumidor em potencial gigantesco, somos o maior país da América do Sul e uma das maiores economias do mundo. O brasileiro gosta de novas tecnologias e é um grande consumidor de diferentes tipos de conteúdo. O contexto mostra que estamos em um momento de transição e que o Brasil precisa se conectar mais com a Ásia e ampliar seus investimentos em educação, redução da burocracia e diminuição das despesas públicas, incluindo a Previdência e folha de pagamento com servidores.
Se essas medidas forem feitas de maneira eficaz, o Brasil passa a ser um solo fértil para o desenvolvimento de novos negócios, atraindo investimentos e gerando emprego. Me vejo contribuindo com o desenvolvimento do Brasil, mas entendendo que minha parte é muito pequena diante do todo.
No entanto, qualquer organização comprometida em incentivar a criatividade e a inovação como estratégias de desenvolvimento sustentável, para qualificar a experiência de vida das pessoas no Brasil e que atue para conectar nossa economia criativa com o mundo, para ampliar oportunidades aos nossos empreendedores e acelerar a internacionalização de startups brasileiras ao redor do mundo, deve ser estimulada e apoiada. Vamos em frente.
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